domingo, 29 de julho de 2012

Seu Madruga


Um homem morreu hoje à noite. Em sua casa. Dizem que foi "de coração". Era um vizinho, daqueles que cumprimentamos sem bem saber o nome. Pouco sabia dele. Em algum momento da vida, bebeu demais. Há bastante tempo, vivia calado. Quase não falava. Dele sabia pouco. Seu apelido: Seu Madruga. E Seu Madruga já não está mais aqui. 

terça-feira, 10 de julho de 2012

Domingo por mim

Um domingo como qualquer outro, melancólico e sem grandes acontecimentos. Lá fora, a melancolia ganhava forma com o céu nublado e o vento gelado. A perfeita combinação para a solidão. Ou para os casais ficarem agarrados, se aquecendo. 

Tarde fria, com leve garoa, e na Avenida Paulista até que tinha bastante gente. Casais envolvidos em cachecóis e abraços. Famílias que passeavam, conversando e rindo. E o termômetro registrando temperaturas cada vez mais baixas. Nem parecia domingo, num fim de tarde, ali naquela avenida, no coração da cidade. 

Envolvido em pensamentos dispersos, quase sem preocupações, caminhava lentamente. O destino: a exposição sobre Nelson Rodrigues no Itaú Cultural. Acompanhado (e mui bem acompanhado) de mim, dos meus vários "eus", deixe-me levar pelas palavras de Nelson. Um verdadeiro banho de tranquilidade: esse era o sentimento ao sair da exposição. Com o perdão do aspecto brega, saí com mais amor no coração. O dramaturgo era um romântico, um apaixonado pela vida. "Tudo é possível quando se gosta", simples frase, mas que ecoou em minha cabeça até chegar à próxima parada, a encenação de "A Falecida", no Teatro do Sesi.


Poupo comentários sobre o conteúdo da peça, fica o convite para que a assistam. Leve e mergulhado em poucas reflexões (algumas negativas), mas gostosas e suaves, deixei meus passos me guiarem. Como um flâneur, só observava o caminhar das pessoas, os gestos, as expressões de alegria, abraços apertados de lindos casais - homens e mulheres, homens e homens, mulheres e mulheres. Cenas inspiradoras de um domingo já chegando ao seu fim. Sozinho, mas junto a meus devaneios, não poderia estar melhor. Uma solidão saborosa, vivida e curtida como nunca. Momento para um diálogo silencioso, daqueles raríssimos. Tempo precioso para colocar de lado aflições e pensamentos ruins.


Só eu e as sensações. Horas sem conexão - com o virtual, com o mundo acelerado e frenético. Sim, prometi para o fim de semana uma coisa: não acessar internet. Rebeldia sem sentido? Não, um desejo, uma vontade enorme de olhar, observar, conversar com meus "eus", escutar, silenciar-se e pouco falar. Viver alguns sentidos pouco aproveitados. 

Ah! Era para ser um domingo como outro já vivido. Se foi, não sei. Mas respirei fundo, tão profundamente, que tudo que estava entalado, engasgado, se esvaiu - neste momento, às 23h deste final de domingo. É... o dia valeu. Por Nelson, pelas pessoas que caminhavam. Enfim, por mim.*

*Texto escrito na noite de domingo, em uma folha de papel, sob uma luz fraca. Se isso importa, não sei. Vale o registro.