segunda-feira, 29 de outubro de 2012

Como Kerouac no topo da montanha


"Depois de todo esse tipo de farra, e ainda mais, cheguei ao ponto em que precisava de solidão e de desligar a máquina de 'pensar' e 'curtir' o que chamam de 'viver'; tudo o que eu queria era deitar na grama e olhar as nuvens", escreveu Jack Kerouac no texto Sozinho no topo da montanha.

Me senti um pouco como Kerouac neste fim de semana. Já era sábado, mas o dia ainda não raiara. O relógio marcava 5h30 e uma cena se repetia: eu estava em uma estação de metrô voltando para casa após uma festa. "Tudo muito igual, cansei disso, de baladas, festas, voltar pela manhã. Será que é um tempo perdido?", pensei, não necessariamente nessa ordem, tampouco com as mesmas palavras. Sossego era o que queria. Parecia que toda a badalação havia deixado de ter qualquer significado. Estaria eu mais velho do que o comum? Ou seria uma crise momentânea, daquelas que logo passam e no fim de semana seguinte retorna a vontade de sair? Sem certeza, muito menos respostas para essas perguntas.

O fim do ano se aproxima. Talvez a tranquilidade seja mesmo um desejo. O silêncio. Vontade de ouvir os sons que vêm da rua, perder-se em divagações. Sentir o cheiro da chuva típica de verão. Pensar um pouco mais na vida: síndrome dos últimos meses do ano. Viagem, a palavra encantadora e a intenção de colocá-la em prática, seja fisicamente ou em pensamentos.

Talvez precise dar uma pausa nas saídas noturnas que se prolongam nas madrugadas. Usar os fins de semana para produzir e também realmente descansar. Basta ficar na janela, escutar a chuva caindo, o vento roçar no rosto. Múltiplas sensações num fim de tarde com os olhos cerrados. Sem música agitada, só com os sons da natureza e da própria respiração.

Texto escrito no domingo, às 21h30.

domingo, 29 de julho de 2012

Seu Madruga


Um homem morreu hoje à noite. Em sua casa. Dizem que foi "de coração". Era um vizinho, daqueles que cumprimentamos sem bem saber o nome. Pouco sabia dele. Em algum momento da vida, bebeu demais. Há bastante tempo, vivia calado. Quase não falava. Dele sabia pouco. Seu apelido: Seu Madruga. E Seu Madruga já não está mais aqui. 

terça-feira, 10 de julho de 2012

Domingo por mim

Um domingo como qualquer outro, melancólico e sem grandes acontecimentos. Lá fora, a melancolia ganhava forma com o céu nublado e o vento gelado. A perfeita combinação para a solidão. Ou para os casais ficarem agarrados, se aquecendo. 

Tarde fria, com leve garoa, e na Avenida Paulista até que tinha bastante gente. Casais envolvidos em cachecóis e abraços. Famílias que passeavam, conversando e rindo. E o termômetro registrando temperaturas cada vez mais baixas. Nem parecia domingo, num fim de tarde, ali naquela avenida, no coração da cidade. 

Envolvido em pensamentos dispersos, quase sem preocupações, caminhava lentamente. O destino: a exposição sobre Nelson Rodrigues no Itaú Cultural. Acompanhado (e mui bem acompanhado) de mim, dos meus vários "eus", deixe-me levar pelas palavras de Nelson. Um verdadeiro banho de tranquilidade: esse era o sentimento ao sair da exposição. Com o perdão do aspecto brega, saí com mais amor no coração. O dramaturgo era um romântico, um apaixonado pela vida. "Tudo é possível quando se gosta", simples frase, mas que ecoou em minha cabeça até chegar à próxima parada, a encenação de "A Falecida", no Teatro do Sesi.


Poupo comentários sobre o conteúdo da peça, fica o convite para que a assistam. Leve e mergulhado em poucas reflexões (algumas negativas), mas gostosas e suaves, deixei meus passos me guiarem. Como um flâneur, só observava o caminhar das pessoas, os gestos, as expressões de alegria, abraços apertados de lindos casais - homens e mulheres, homens e homens, mulheres e mulheres. Cenas inspiradoras de um domingo já chegando ao seu fim. Sozinho, mas junto a meus devaneios, não poderia estar melhor. Uma solidão saborosa, vivida e curtida como nunca. Momento para um diálogo silencioso, daqueles raríssimos. Tempo precioso para colocar de lado aflições e pensamentos ruins.


Só eu e as sensações. Horas sem conexão - com o virtual, com o mundo acelerado e frenético. Sim, prometi para o fim de semana uma coisa: não acessar internet. Rebeldia sem sentido? Não, um desejo, uma vontade enorme de olhar, observar, conversar com meus "eus", escutar, silenciar-se e pouco falar. Viver alguns sentidos pouco aproveitados. 

Ah! Era para ser um domingo como outro já vivido. Se foi, não sei. Mas respirei fundo, tão profundamente, que tudo que estava entalado, engasgado, se esvaiu - neste momento, às 23h deste final de domingo. É... o dia valeu. Por Nelson, pelas pessoas que caminhavam. Enfim, por mim.*

*Texto escrito na noite de domingo, em uma folha de papel, sob uma luz fraca. Se isso importa, não sei. Vale o registro.

quinta-feira, 31 de maio de 2012

Paixão de cursinho

Corpos próximos. Uma garota e um garoto. Empolgados, conversam sobre o cursinho pré-vestibular. Ela fala mais rápido, quase sem pausas. Dispara a contar causos das aulas, comentar a postura de professores. Nos olhares, o brilho. Escondem um desejo, ela mais. Ofegante, entusiasmada. 


De repente, é hora da despedida. Simples tchau. O que o rapaz não viu foi o sorriso escancarado, estampado no rosto da garota. Ela põe um fone de ouvido e começa a mexer a boca, seguindo a música que ouve. Alegre, parece sonhar, viajar. Nasce uma daquelas paixões de cursinho, passageiras, mas intensas? 

segunda-feira, 19 de março de 2012

Natural, suave e saboroso

Um simples momento, explosão de alegria. Sem medo de experenciar. Foi assim, assim foi. De um ato, mais um montão parecido com o primeiro. Naturais, suaves e saborosos. Magia no olhar, no tato, perfume que embalou o olfato. Som que embalava o momento, ah!, por vezes se esvaiu. Culpa das energias, que se misturaram, trocaram seus segredos.

A pausa, o silêncio e novamente o enlace e desenlace das mãos. Música nova na pista, daquelas contagiantes. Risos dão o tom, sorrisos estampados nos rostos cada vez mais próximos. Calor que contrastava com o frio pulsante da rua. Só aquecia o momento. Natural, leve e saboroso. "Seja lá onde for, deixa o sol te levar... Te guiar só pra cá...", a la Móveis Coloniais de Acaju, em "Descomplica.

terça-feira, 13 de março de 2012

Cena no ônibus

Sabe aquele olhar de quem está louco por algo? O cobrador do ônibus tentava disfarçar. Em um dos dedos da mão direita dele, uma aliança. O objeto da cobiça do rapaz era uma garota bonita, morena clara, de cabelos longos e castanhos, com um olhar intenso e profundo. Em sua mão direita branquinha, também brilhava uma aliança prateada. Sinal de compromisso - dele e dela. E tudo não passou de uma troca de olhares. Com vantagem para o moço, aparentemente mais safadinho.

domingo, 26 de fevereiro de 2012

Prazer que vem das palavras

Repentina e intensa; algo como o desejo por alimentar-se. Eis a vontade de escrever. Às vezes, não há ideias, só pensamentos que se confundem. Gostoso é deixar com que as palavras ganhem formas, combinem-se umas com as outras. Sentido? Ah, pensamos nisso depois. Só nos resta sonhar e transformar essas fantasias em texto. Faço isso neste instante. Por puro prazer - e um pouco de necessidade. Aquele momento em que precisamos nos desvelar. 

Mágico é esse ato, o de escrever. Agarra-nos com tamanha força que somos levados para outros mundos. Companheiro de viagens inesquecíveis, delírios saudáveis. Tudo tão sem sentido e, por isso mesmo, gostoso. Sem regras, caminhos definidos. Na estrada, só você, a imaginação e as palavras. Uma música de fundo pode, tudo bem! É devaneio que não acaba mais. Criamos personagens, histórias inconcebíveis na realidade nua e crua. São frutos de nossos desejos mais íntimos, profundos... (assim, com reticências).

As tão sonhadas (e impossíveis) asas para o ser humano. Liberdade. Pra que mais? Ok, mais um desejo: aquele vento suave a roçar nas bochechas. O cabelo esvoaçante, sem preocupação com o penteado. Não há limites. À sua frente, um caminho inteiro, vazio. Sol brilhando entre nuvens macias. Sensação de paz e tranquilidade. Palco perfeito para montar cenários, um roteiro possível só na imaginação. Direção por sua conta. Pronto, uma peça. 

A escrita assim, simples e descompromissada, é um convite para nossas loucuras. As mais intensas, quiçá proibidas - tudo mais saboroso. Ai, ai, ai... 

domingo, 29 de janeiro de 2012

Na estrada com Kerouac

Nova York, década de 1940. Com sua escrita livre, Jack Kerouac convida para um mergulho. Ou melhor, para uma viagem estrada afora. O destino: Denver, no estado do Colorado, oeste norte-americano. Mais de cinquenta anos depois, seguimos a rota. Carona atrás de carona, acompanhamos aquele jovem e sonhador escritor. Sonhamos com ele, enfrentamos os perigos... Enfim, nos deixamos levar pela prosa gostosa e incansável, sem interrupções, parágrafos, muito menos capítulos. Nada melhor para uma tarde de domingo em casa.

Pausa para o almoço. Kerouac fica de lado por um tempo. Minutos depois volta com todo fervor. Páginas e mais páginas viradas de forma intensa. O tempo passa, a semana está perto de começar - na São Paulo de 2012. Na viagem, estamos cada vez mais próximos de Denver. E lá não há preocupação com uma nova semana. Vida de boemia, beirando à vagabundice. Já com menos de 20 dólares no bolso, o escritor louco pula de veículo em veículo. Sempre há espaço para aproveitarmos juntos a carona. 

Horas depois, talvez dias, a tão sonhada chegada no oeste americano. Estamos efusivos; ao mesmo tempo, cansados. Na rodoviária, sem ao menos uma moeda. Sem também alguma preocupação. Roupa surrada, poucos pertences, aquele escritor se hospeda na casa de um amigo. Começa, enfim, a perambular pela noite, cercado dos melhores amigos, de mulheres. Regado a uísque, cerveja e cigarros. 

Peço um tempo. Sem virar mais páginas, continuo a viagem - imaginação e fantasia. Toca João Bosco, o efeito relaxante e motivador. Após "Papel Machê", a leveza e magia de "O bêbado e o equilibrista". Um copo de café, puro e quentinho. Enquanto isso, Kerouac e seus parceiros curtem as loucuras nos bares e boates de Denver. Na década de 1950,  surge "On the road", fruto daquelas andanças e experiências do escritor americano. Rolos de papéis datilografados em meio a copos de café. Palavras escritas de uma só vez. 

A aventura ainda não terminou. Talvez, mais tarde, iremos novamente ao encontro de Kerouac, Neal Cassady e cia. E a viagem pelas ruas boêmias da capital de Colorado, nos anos 40, continuará. Agora mais um pouco de café. No final da noite, (imaginárias) doses de uísque e cerveja... 

quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

Do outro lado da rua, o carro...

Mais de onze horas da noite. Ouvindo de Bob Marley a Móveis Coloniais de Acaju, observo o céu estrelado. Um mar azul-escuro, repleto de pontinhos brancos que aguçam a imaginação. A cena dá asas e o combustível necessários para inúmeras viagens. Não perco a oportunidade. Deixo a mente flutuar. Contemplo a lua brilhante. Na imensidão, ela é a protagonista. De sonhos e fantasias.

Caminho até o portão. É hora de divagar mais um pouco. Até que uma visão tira-me daquele passeio delirante. Não, não pode ser. Um carro está parado do outro lado da rua. Pequenino e vermelho escuro, parece dormir em um sono profundo. Suas luzes apagadas se confundem com o que aparentemente acontece em seu interior. Observo com atenção redobrada. Não vejo aquele ser balançar. Pelo contrário, ele hibernou. Limpo os óculos para ver se consigo enxergar algum movimento dentro do veículo. Nada. Só avisto luzes de celular vindas de lá, que acendem e apagam a todo o instante. É um sinal? Talvez.

A vontade que dava era de se transformar em uma mosca praticamente invisível. Sem barulho, aproveitar alguma brecha de janela aberta e assistir ao espetáculo de camarote. Como isso é impossível, só restaram a imaginação e, claro, a mente poluída. Afinal, o casal (se é que era mesmo, talvez fosse uma pessoa esperando alguém...) poderia estar no meio de uma DR. Vai saber. Mas que eu fiquei curioso, ahh! eu fiquei...




domingo, 1 de janeiro de 2012

Fantasia, imaginação e prazer - Feliz 2012!

Não se faz mais Réveillon como antigamente (falo como se já tivesse vivido séculos). Só senti falta da animação contagiante, do barulho ensurdecedor dos fogos, dos gritos gostosos de Feliz Ano Novo, da loucura extasiante. Chatice minha à parte, seja bem-vindo, 2012!

E eu, como de costume, estou contemplando a madrugada. À minha frente, uma taça de champanhe. Reflexões ganham forma. O enredo é perfeito: silêncio, dia quase clareando, brisa suave lá fora. A cada gole de champanhe, uma viagem. No intervalo entre o som das teclas enquanto digito, ouço ainda alguns fogos de artíficio retardatários. A tranquilidade toma conta do ambiente...

... Uma pausa. Com ela, a vontade de uma música. O som emana de "Buffalo Soldier", de Bob Marley. Cenário completo para os devaneios, que certamente atravessarão a manhã deste 1º de janeiro. Flutuando... Queria ter asas para acompanhá-los. São mais rápidos do que eu. Talvez os alcance em algum sonho, numa existência imaginária. Divagações e fantasias da madrugada. O leve prazer de criar e viajar que tornam a vida mais bem-vivida. Por isso, "live if you want to live", como disse Bob em "Positive Vibration. Bons sonhos! E um excelente 2012!